Perguntam-me se temo que os empresários leiam este
artigo? Não.
Perguntam-me se temo que os desempregados leiam este
artigo? Claro que não.
Perguntam-me se temo algo? Sim, temo que não se
aprenda nada com os dias de hoje e que fique tudo na mesma, que a única coisa
que muda é o desemprego a subir e as falências a aumentar. Isso é que eu temo.
O país precisa de mais líderes e
empreendedores, já.
O nosso desafio, o desafio dos gestores, líderes e
empreendedores, é procurar fazer mais pelas empresas portuguesas e não procurar
o melhor trabalho possível para cada um. Isso não existe à partida. Isso é
consequência e vem depois.
Falo de novas lideranças, novas energias, iniciativas
novas e fraturantes.
Se um país investiu tanto em conhecimento e
experiência em várias gerações de pessoas, profissionais, gestores, líderes,
com licenciaturas, em cultura empresarial, em organização do trabalho, com
mestrados, MBA, etc., porquê deixar fugir estes valores?
É um crime intelectual.
É um crime que um país tão desenvolvido como o nosso,
em formação, em tecnologias de informação, em estudos empresariais, em cultura
financeira, em gestão de recursos humanos, em domínio de idiomas, em marketing,
comunicação e inteligência emocional, em formação profissional, deixe os seus
quadros à deriva. Que deixe quantidades sérias de quadros preparados
completamente à deriva.
É um atentado ao talento.
Como é possível que tanta experiência e
conhecimento vão para o desemprego e se inscrevam para um subsídio, fiquem numa lista de
procuras de emprego e se limitem a fazer contas a quantos meses vão ter de
subsistência?
Como é possível que esta preparação toda seja colocada
na prateleira nacional ou até mesmo perdida nas empresas de outros países?
Então nós, Portugal, é que os preparámos e agora
deixamo-los ir para o estrangeiro?
Esta é a preocupação à escala nacional mas também o deve ser ao nível de cada empresa. Reter talento.
Tem de haver muito mais a fazer e eu acho que de facto
há muito mais a fazer.Esta é a preocupação à escala nacional mas também o deve ser ao nível de cada empresa. Reter talento.
Façamos um pequeno diagnóstico para entendermos o que pode ser diferente.
Há dois grandes responsáveis por tudo isto:
1) Os próprios desempregados porque, para além desta experiência toda e deste conhecimento todo, sempre se habituaram a ter um emprego, um cargo, um salário e uma vida equilibrada entre casa e trabalho. Ao tentarem manter todo este conforto decidiram não lutar pelas empresas em que estavam integrados e foram muito cúmplices de má gestão e lideranças incompetentes. Quadros que se esconderam no chavão “a empresa não é minha e não sou eu que mando”. Pois bem, isso foi desculpa de mau pagador para quem não quis pôr as mãos no fogo. Não lutaram por uma empresa melhor e depois pagaram a fatura. Não exigiram saber mais e intervir mais.
Ainda hoje vejo muito disso. Ai como vejo. Quadros que veem os empresários, os chefes, os líderes, a conduzir mal a empresa e nada fazem. Criticam, incomodam-se, stressam, não dormem de noite mas, no dia seguinte, fica sempre tudo igual. Fazem tudo na mesma. Acham que se forem uns yes man as coisas compõem-se. Vai passando. Contam os dias e esperam o fim do mês. Esqueçam. O tempo já não resolve nada.
Isso acontecia em meios económicos herméticos mas, com a globalização, a inoperância de uns é o sucesso de outros. A incompetência de uns é o sucesso de outros. A passividade de uns é o sucesso de outros.
Os próprios desempregados de hoje são muito responsáveis pela sua própria situação porque foram muito complacentes ontem e, devo afirmar contundentemente, os que são complacentes hoje serão os desempregados de amanhã. Certinho. Contem os dias.
Solução: aos quadros desafio a que ataquem os líderes incompetentes e incapazes e lutem por aplicar a vossa própria opinião, se a tiverem. Uma organização é feita por todos e cada um tem de contribuir ativamente. Ter um líder incompetente não é uma fatalidade. É um desafio fazer com que a sua incompetência não afete a empresa.
2) Os empresários também são muito responsáveis porque, para além de quererem as suas empresas melhores, não sabem querer mais nada.
Querem melhorar as empresas aumentando as vendas mas não apostam em novas pessoas, novas ideias comerciais e novas variáveis de negócio. Querem reduzir custos mas despedem pessoas competentes só porque estão a contrato a termo certo. Valha-me Deus.
Querem novas filosofias de gestão mas rejeitam lideranças com novas iniciativas e voltam à “velha guarda”. Querem a empresa a prosperar mas têm medo da internacionalização. Querem que a empresa seja viável mas não aceitam novos sócios. Preferem ser 100% donos de uma empresa que está em queda do que ter apenas 50% de uma empresa com futuro. Por vergonha, suponho.
No entanto, fazem pedidos, movem influências, fazem choradinhos, tentam agradar a “gregos e a troianos”, “querem estar bem com Deus e com o Diabo” mas devem muito à determinação, coerência e confiança nos outros.
Isto não vai lá com pedidinhos e falinhas mansas.
Os empresários estão a mudar muito, bem sei, mas ainda consideram os recursos humanos apenas um custo. Durante anos pagaram salários, formação e experiência e mesmo assim continuam a “contar as pernas e a dividir por dois” para verem quantos despedem.
Dizem que as pessoas são o maior ativo das organizações mas estão sempre a falar de produtividade, custo de pessoal, vendas per capita, quanto me custa este, quanto me custa aquele, etc., etc.
Há maneira diferente de ver as coisas? Ah pois.
As pessoas são iniciativas, logo pode contabilizar-se ideias por pessoa.
As pessoas são emoções, logo pode medir-se o clima social.
As pessoas são dinâmicas, logo deve promover-se a mobilidade.
As pessoas são empreendedoras, logo deixá-las fazer coisas dentro da empresa.
As pessoas são líderes, logo deixá-las decidir, comandar e reestruturar.
As pessoas somos nós, logo deixá-las ser felizes nas empresas.
Creio, muito sinceramente, que a grossa maioria de empresários nacionais tem medo de arriscar nos outros. Têm medo de arriscar nas pessoas internas, nas pessoas que trazem ideias, nas pessoas que trazem parcerias, nas pessoas que trazem novos mundos. Arriscam em si e ponto.
Querem negócios à sua maneira e à porta de casa. Não há, ponto final.
Solução: aos empresários deixo o desafio a que se abram às iniciativas internas de pessoas da empresa mas, também e essencialmente, abram as portas a profissionais que estão livres no mercado com bons currículos. A que invistam mais em conhecimento humano sacrificando a conta de resultados no imediato. A médio prazo, seguramente, este conhecimento dará resultados. A vida não são dois dias, muito menos a vida das empresas. Não procurem os resultados para amanhã mas, sim, para depois de amanhã.
Apostem, Meu Deus.
A agravar tudo isto, temos mais uma chatice. Temos em Portugal um raio de um preconceito com o valor dos desempregados que não nos deve deixar indiferentes. Quem está a trabalhar é que é bom. Os desempregados são valores residuais. Parecem menos válidos.
Por acaso nunca pensei assim e quem me acompanhou sabe que sempre tratei o valor por igual em ambas as circunstâncias, mas, hoje, isto ainda é mais verdade. É ainda mais importante e não é por haver mais desempregados. É mesmo atendendo ao talento disponível.
Inspirado neste preconceito, desenvolvo o que poderia ser o mote para uma tese em gestão de pessoas.
Antes os desempregados eram o elo mais fraco porque não tinham valor para entrar nas empresas. Muitos cumpriam um excesso de trabalho e, uma vez terminado, saíam da empresa. Taxa de desemprego na casa dos 7% e assim funcionava o mercado.
Agora, devemos considerar que, duplicada esta taxa para os 15%, as razões dos incrementos podem ser:
- empresários que não conseguiram manter as suas empresas face à crise e fecharam totalmente. Pois bem, o bom talento que aí havia está no desemprego.
- empresários que decidiram reduzir pessoas e fizeram-no numa base contabilística; logo dispensaram os mais baratos (salários vs vínculo) independentemente do talento.
- os bons, irreverentes e que por brio não se identificaram com as lideranças incompetentes das chefias tomaram a decisão de sair.
- e, claro, pessoas recém-preparadas com estudos mas sem espaço de trabalho. Preparadas, portanto.
O mercado de capital humano e gestão de talento está a reajustar-se para novas medidas de recrutamento, avaliação de potencial e formação. Esta ideia de ir recrutar a uma empresa um profissional para movê-lo para outra pode estar a estragar o mercado em dois sítios, simplesmente por capricho e preconceito do empregador destino. É preferível usar as empresas de research (especialistas, portanto) para avaliar o mercado em geral e deixar trabalhar quem está a trabalhar.
O país está a mudar.
Já mudou muito e vai continuar a mudar. Em minha
opinião vai piorar. Não vou dizer que é pela austeridade e falta de engenho
económico porque isso é evidente. Prefiro dizer que vai mudar ainda mais e para
pior porque o desemprego vai continuar a aumentar e pelas mesmas razões de
antes. Por um lado, porque há quadros que estão passivos nas empresas e a
pactuar com inabilidades das chefias e empresários e, por outro, os empresários
estão a ver no que vai dar o futuro e não agem. Não fazem reformas, nem de
modelos nem de lideranças. Em qualquer dos casos, o tempo será fatal.Há exceções, claro que há exceções. Graças a Deus!
O país está a mudar.
Já mudou muito e vai continuar a mudar. O que vai na nossa cabeça está em constante mutação e é assustador o que vamos aceitando.
Pessoas a aceitarem fazer qualquer coisa só para trabalharem perto de casa.
Pessoas a aceitarem qualquer coisa só para não estarem paradas.
Pessoas a fazerem coisas que, há um ano ou dois, criticavam nos outros.
Pessoas a deprimirem-se e a ziguezaguearem só para ocuparem o tempo.
Pessoas a aceitarem sair do país.
Esta é a parte importante. Agridoce mas
importante – sair do país.
Se estes valores humanos aceitam a saída de Portugal,
por que é que os empresários os despedem para reduzir custos? Por que é que
estes profissionais não são aproveitados para fazerem sair as empresas num
processo de exportação, internacionalização ou novos negócios? Os empresários
têm de envolver todos estes recursos na viabilização das suas empresas, seja
qual for a solução.Creio que esta é a grande mudança e a mais importante de todas – mobilidade. Oxalá seja mesmo. Que a mente dos quadros de hoje os deixe disponíveis para saírem do país. Ontem, o que queriam era apenas um trabalho e um aumento salarial anual acima da inflação. Contentavam-se com pouco e olhem no que deu essa falta de ambição. Nem eles cresceram nem fizeram crescer as empresas.
Esta é grande mudança e a mais importante de todas. Os quadros de hoje aceitam internacionalizar-se, internacionalizando as empresas.
Empresas e empresários, toca a aproveitar isso e não inventem a roda. Os descobrimentos há 500 anos foram feitos com a prata da casa. Foram feitos por portugueses. Foram feitos por quem já estava cá dentro. Cá dentro mas a fazer crescer esse “dentro” aumentando o protagonismo do país no mundo.
Cá dentro, por dentro mas a olhar para fora.
Cá dentro, em Portugal. Por dentro, por Portugal. A
olhar para fora porque o futuro das empresas é a internacionalização, a
exportação, a globalização.Estou convencidíssimo de que mais importante que um gestor experiente sair do país para melhorar o seu rendimento é levar as empresas para fora do país para aumentarem os seus rendimentos. Eu, se ajudar as empresas em Portugal a crescer, mesmo que seja saindo, estou a cuidar das várias pessoas nessas empresas e a cuidar de mim mesmo. É um desígnio.
Estou convencidíssimo de que ainda há matéria e empresas em Portugal onde aplicar a minha energia, conhecimento e liderança mas, claro, cá dentro a olhar para fora.
É importante que os empresários abram espaço a novas iniciativas de liderança. Isso é que é o ponto de viragem da cultura empresarial nacional.
Nota: nesta
reflexão eu poderia criticar o Governo ou simplesmente referir-me a Ele mas, “é
chão que já deu uva”. É um protagonista do qual não devemos esperar muito, seja
ele qual for.
José Marques
Mendes